Por ROBERTO VIEIRA
… o milésimo gol está prestes a
se tornar banalidade, mas antigamente era coisa muito séria, seríssima!
Ele
marcou o milésimo gol na escola.
Em segredo.
Na pelada do recreio.
Não teve foto, nem festa, nem
sorvete de chocolate.
Apenas a sensação do dever
cumprido.
Futebol é bola na rede,
segundo seu pai.
Embora a barra da escola não
tenha rede.
Nem barra.
É apenas um espaço entre dois
paralelepípedos no infinito infantil.
Coisa estranha.
Na noite do milésimo gol não
dormiu direito.
Sonhou com a palmatória na
escola.
Sonhou com o padre e diretor
falando do inferno.
Acordou assustado.
Não dormiu mais.
As aulas de matemática e
geografia pareceram intermináveis.
Ficava pensando no caderninho
na bolsa.
999, 999, 999, 999.
A tampinha de refrigerante
caiu no seu kichute direito.
O chute saiu certeiro.
Gol.
Queria correr para os braços
do pai.
Sentir o beijo da mãe.
Calou-se.
Escreveu no caderno.
1000, 1000, 1000, 1000.
Segredo particular,
particularíssimo.
Ele e Deus na sacristia.
Caminhando pra casa na Conde
da Boa Vista, soluçou.
Mas um homem não deve chorar,
segundo seu pai.
Nem no dia do seu milésimo
gol.
Nenhum comentário:
Postar um comentário